Elogios de Donald Trump ao presidente brasileiro destacam conversa recente na ONU e sinalizam tom mais amistoso no diálogo bilateral
O gesto público de Donald Trump ao dizer que “gosta” de Lula e que houve “química excelente” entre os dois líderes marca uma guinada simbólica na relação entre Brasil e Estados Unidos em meio a um cenário de disputas comerciais e tensões diplomáticas recentes. Em discurso e entrevistas, Trump descreveu Lula como um “homem agradável” e admitiu que o encontro rápido na Assembleia-Geral da ONU foi suficiente para abrir um canal de diálogo pessoal, algo que analistas consideram relevante para destravar pautas sensíveis. O ambiente externo acompanha de perto esse movimento, visto como um teste de até onde a retórica dura do ex-presidente americano pode conviver com negociações pragmáticas sobre tarifas, investimentos e cooperação estratégica.
Nos bastidores da diplomacia, interlocutores relatam que a aproximação tem forte componente de cálculo político, tanto em Washington quanto em Brasília, em um momento em que as duas lideranças buscam fortalecer suas imagens perante eleitorados internos polarizados e atentos à cena internacional. Lava-se, assim, parte das arestas criadas pelo tarifaço imposto por Trump a exportações brasileiras, sobretudo em setores como aço, alumínio e produtos agroindustriais, que exigiram reação coordenada de Lula em defesa da indústria nacional. Especialistas em relações internacionais afirmam que, ainda que o tom pessoal pareça amistoso, cada lado seguirá defendendo com firmeza seus interesses econômicos e geopolíticos, tornando a relação um jogo de equilíbrio entre cordialidade pública e negociações duras.
A imprensa internacional, em especial veículos de referência na cobertura de economia e política externa, descreveu o episódio como uma espécie de “trégua retórica”, na qual dois líderes conhecidos por discursos inflamados optam por um raro momento de elogios mútuos. Segundo análises, Trump tenta moderar o discurso em relação ao Brasil sem abandonar sua marca de nacionalismo econômico, enquanto Lula aproveita o espaço para reforçar a imagem de negociador habilidoso e respeitado em diversos fóruns multilaterais. Essa combinação, avaliam observadores, pode facilitar acordos pontuais em áreas de interesse comum, como energia, transição verde e segurança regional, desde que os canais diplomáticos sejam preservados e fortalecidos.
No cenário doméstico brasileiro, a fala de Trump gerou reações divididas: setores conservadores que orbitam o trumpismo veem com reservas a aproximação com Lula, enquanto parte do empresariado, sobretudo ligado à exportação, enxerga na distensão de ânimos uma oportunidade concreta de aliviar barreiras comerciais e abrir portas para novos negócios. Paralelamente, correntes progressistas avaliam que o reconhecimento público de um adversário ideológico como Trump reforça o peso de Lula como ator global, capaz de dialogar com diferentes polos do espectro político internacional sem renunciar a pautas como democracia, combate à desigualdade e proteção ambiental.
Diplomatas de carreira lembram que a história da política externa brasileira é marcada por períodos de intensa proximidade e de forte distanciamento em relação aos Estados Unidos, e que momentos de elogios públicos já foram, em outras ocasiões, sucedidos por disputas duras em organismos multilaterais e mesas de negociação. Para eles, mais importante que a frase de efeito é observar se haverá mudanças concretas no tratamento dado a temas como tarifas, cooperação tecnológica, investimentos em infraestrutura e compromissos ambientais, onde persistem divergências significativas entre as agendas de Trump e Lula.
Analistas em comércio internacional destacam que o Brasil, sob Lula, tem apostado em uma estratégia de diversificação de parceiros, com fortalecimento de laços com BRICS, União Europeia e países do Sul Global, o que aumenta o poder de barganha do país frente a eventuais ameaças tarifárias unilaterais vindas de Washington. Nesse contexto, a aproximação retórica de Trump não significa dependência, mas pode ser aproveitada para negociar condições mais favoráveis em setores estratégicos sem abrir mão de articulações paralelas com outras potências e blocos regionais.
Ao mesmo tempo, a cena em que Lula e Trump trocam elogios ocorre em paralelo a discursos firmes do presidente brasileiro na ONU, nos quais ele defende a condenação de golpes e autocracias, inclusive usando a condenação de Jair Bolsonaro como exemplo de reação institucional brasileira contra aventuras autoritárias. Essa dualidade — diálogo cordial com um líder conservador e defesa contundente da democracia em arenas multilaterais — é lida por especialistas como expressão da aposta de Lula em um multipolarismo pragmático, onde o Brasil fala com todos, mas não abdica de princípios centrais.
Em Washington, a repercussão entre comentaristas políticos indica que Trump tenta, ao suavizar o tom com Lula, calibrar sua imagem perante setores empresariais que veem no Brasil um parceiro importante, ao mesmo tempo em que evita abrir flanco de críticas de que estaria se isolando de grandes economias emergentes. Já em Brasília, a diplomacia trabalha para transformar o gesto simbólico em ganhos concretos, mantendo a postura de não submissão e de defesa da soberania nacional que marcou a resposta ao tarifaço, mas explorando qualquer brecha para reduzir barreiras e ampliar fluxos de comércio e investimento.
Fontes: BBC Brasil, G1, Agência Brasil, The New York Times, Bloomberg, ONU
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